23 de jul. de 2012

Blogs na mira do copyright

Por Matheus Rosa e Victor Eskinazi

Interface do blog Um Que Tenha
É de proporção global e facilmente reconhecível a proliferação de comunidades, blogs e diversos outros recursos na internet para compartilhamento de diversos tipos de arquivos através da possibilidade do download instantâneo. Dentre esses arquivos possíveis de serem acessados estão livros, filmes e discos, muitas vezes salvaguardados por leis de copyright. Tal questão é um embate que tende a se agravar cada vez mais, e um motivo de muita preocupação para produtores culturais, gravadoras e demais entidades responsáveis pela demanda cultural nos meios pré-internet. Todo o conteúdo fica disponível para compartilhamento de qualquer computador com internet, desde lançamentos da indústria do cinema até discos raros e esquecidos por seus autores e fãs.



Na verdade, compartilhando tais arquivos é o mesmo que estar distribuindo, o que configura infração na lei de direitos autorais, caso o conteúdo seja protegido e não seja disponibilizado por algum de seus titulares legais; é uma forma de pirataria mas diferentemente do que observamos nas ruas das metrópoles em bancas de camelôs, por exemplo, tal distribuição não é feita por um conluio de infratores ou por criminosos organizados, burladores de alfândegas e atos afins. Normalmente são colecionadores de discos, livros ou filmes e fãs destes materiais, cidadãos fora do cenário do mercado cultural que atuam muitas vezes anonimamente e encontraram na internet a chance de compartilhar seus acervos e fazer inclusive contato com mais pessoas que também têm o mesmo gosto por determinadas obras.

Um dos exemplos mais icônicos desse movimento de distribuição de material cultural é o da antiga comunidade do site de relacionamentos Orkut, a Discografias. Ao todo, a comunidade permaneceu durante cerca de 4 anos, sendo integrada por quase 1 milhão de usuários, sendo que o conteúdo da comunidade era visível e disponível para qualquer perfil do Orkut, participante da comunidade ou não. Conteúdo este composto por um vasto número de álbuns de música de vários artistas, compartilhadas de forma totalmente gratuita. Tal facilidade em adquirir material cultural protegido por copyright chamou a atenção de produtores, compositores, músicos e gravadores, considerando a proporção da infração de direitos autorais sendo realizada pela comunidade. Após meses de solicitações de retiradas de links para arquivos de música, a Associação Antipirataria Cinema e Música finalmente conseguiu retirar a comunidade do ar. Aos membros foi deixado apenas um aviso informando aos usuários o encerramento das atividades em função de ameaças da APCM e diversos outros órgãos defensores de direitos autorais. O comunicado oficial da entidade sobre o assunto dá conta de que era clara a dedicação da comunidade Discografias em disponibilizar o material de forma ilegal, desrespeitando os canais legais de distribuição e toda uma rede de cantores, produtores fonográficos, compositores e enfim, acrescentando ao final considerar um avanço positivo o fim da comunidade Discografias.

Outro sítio da internet relevante na distribuição de material cultural gratuitamente para os usuários é o blog Loronix, administrado pelo músico carioca Mauro Caldas. Com o nome de usuário Zeca Louro, Mauro é dono de um dos blogs mais conceituados nacional e internacionalmente do país, tanto no cenário musical como no geral. Com posts escritos em inglês justamente buscando a divulgação global, o site recebe mais de 3 mil visitas por dia e já teve acessos de usuários de mais de 190 países. Sobre as infrações de copyright, Mauro tem uma postura cautelosa sobre o assunto: "Em meu blog não publico o trabalho de algum artista que, por exemplo, tenha ficado por um período de mais de dez anos sem divulgar nenhuma obra e lançou um disco recentemente", diz. "O blog Loronix disponibiliza apenas material antigo, sem possibilidades de ser encontrado de outra forma. A indústria sabe a diferença de quem faz isso, talvez por esse motivo eu nunca tenha sido notificado por entidades de direitos autorais. Inclusive sou contatado por pessoas da indústria fonográfica me questionando se possuo determinado material, capas de discos antigos para relançamento, e me sinto feliz em colaborar", explica. "Na verdade até já fui contatado por artistas ou alguém ligado a eles solicitando gentilmente que o trabalho fosse retirado do ar, o que eu atendi de pronto. Em um caso, o produtor do artista pediu para retirar o trabalho e depois o próprio artista reclamou e disse que não se impostava com a disponibilização gratuita. Alguns inclusive pedem para que seus discos sejam colocados no blog, acabo contribuindo com a inclusão digital desses artistas nesses novos tempos", diz Mauro.

Outro blog importante é o Um Que Tenha, cujo autor Fulano Sicrano (que prefere não se identificar) teve inclusive que mudar o servidor do blog, em função de notificações da indústria. ironicamente, ele coloca uma seção "Um Que Tinha" no novo blog, explicando a situação aos visitantes:

Acabei de receber uma notificação do Google/Blogger de que o Um Que Tenha infringe o DMCA (Digital Millennium Copyright Act), a norma norte-americana que regula direitos autorais. Nomearam e me pedem que, nos próximos 3 dias (ou dia 19 de agosto, na estranha conta deles), sejam eliminadas exatas 1.264 publicações, ou seja, tudo o que foi publicado entre abril de 2006 e abril de 2007. Obviamente, não vou fazer isso. Já vimos esse filme, ele se repete todo segundo semestre do ano, há pelo menos três anos. Na cabecinha miúda deles, agora é a vez de retirar do ar o Um Que Tenha, como fizeram no ano passado com o Som Barato, e antes disso com outros excelentes blogs musicais. Coitados, não aprenderam nada.

Abaixo ainda, consta o link para a íntegra da notificação. O autor do Um Que Tenha diz que boa parte do seu conteúdo é inclusive fornecido pelos próprios artistas, buscando maior divulgação. "O blog certamente obteve sucesso tanto entre internautas como entre artistas. Recebemos cerca de 12 mil visitas diárias. Alguns artistas gostam e solicitam para que seu trabalho seja divulgado, mas preferem manter-se em sigilo, com medo de contrapartidas de seus produtores e gravadores", revela. O blogueiro Fulano Sicrano sugere ainda o que seria uma espécie de solução para o conflito: "Que seja pago um valor mensal para que as pessoas possam ter acesso a todo o material possível e existente, da mesma forma como se paga os provedores de acesso a internet".

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