16 de jul. de 2012

A ressurreição do vinil

Por Gabriel Rizzo Hoewell

Fotos: Gabriel Rizzo Hoewell
A experiência do vinil é “tátil, visual e auditiva”, acredita João Augusto, o empresário que, em 2009, reabilitou a Polysom. A fábrica de vinis fechara em 2007, quando, após oito anos de atividade, começou a enfrentar problemas financeiros e técnicos. A Polysom não suportou a baixa demanda, que por um bom tempo fora apenas compensada pelos pedidos de fabricação de discos para igrejas evangélicas. A situação, no entanto, foi revertida, e o investimento que parecia arriscado tende a crescer junto com o mercado do vinil. Mesmo antes de reabrir, e já há muito tempo, a fábrica carioca era a única da América Latina. É provável, contudo, que esse posto seja deixado de lado em breve.


O crescimento do mercado do vinil – talvez explicado pela distinta experiência sensorial que João Augusto comenta – é espantoso. Em 2011, segundo pesquisa da Nielsen Soundscan, foram vendidos 3,9 milhões de discos nos Estados Unidos, um aumento de 39,3% nas vendas se comparado a 2010. O índice é mais que o dobro do ano de 2008. Se avaliarmos os últimos 15 anos de vendas de vinis nos EUA, o crescimento impressiona ainda mais: 245,5% em relação a 1999, quando foi vendido 1,1 milhão. O destaque, tanto no mercado norte-americano, quanto no britânico, é a banda inglesa Radiohead, líder de vendas no Reino Unido em 2011, com King of Limbs, e nos EUA em 2008, com o disco In Rainbows (25.800 unidades), mesmo ano em que Ok Computer, do longínquo 1997, ficou em 10º na lista. Ninguém bate, entretanto, os Beatles, que em 2011 venderam 41 mil cópias de Abbey Road (1969) e pelo terceiro ano seguido foram os mais comprados pelos estadunidenses. Clássicos, como o próprio quarteto de Liverpool, Guns ‘n’ Roses e Pink Floyd seguem movimentando o mercado do vinil, mas músicos novos também resolveram apostar no crescente nicho. É o caso de Bon Iver, Adele ou The Black Keys, que, juntos, venderam quase 90 mil cópias no ano passado só nos Estados Unidos. Ainda assim, é preciso salientar que os números não significam tanto: apenas 3,9% das vendas totais nos EUA são referentes a vinis. O mais interessante de se analisar é que o seu crescimento cada vez mais visível, que, aliado às vendas digitais, proporcionou ao mercado fonográfico estadunidense a primeira subida desde 2004.

Os reflexos dessa mudança já são percebidos no Brasil. “O disco tá pegando força”, se anima José Antônio Marques, que há sete anos vende vinil na feira do Mercado Público de Porto Alegre. É na venda em feiras que os “bolachões” encontram mais saída no Brasil. Antes de se estabelecer no Mercado, José Antônio vendia em sua loja de instrumentos na Av. Júlio de Castilhos e na Borges de Medeiros e na José Montaury, como camelô. Para confirmar o fortalecimento do disco, José Antônio conta que a segunda fábrica brasileira de vinil está se firmando em Passo Fundo e pretende apostar em célebres nomes do rock gaúcho para crescer.

É evidente, contudo, que o mercado brasileiro está muito distante do europeu ou norte-americano. É por isso que José Antônio e muitos dos vendedores daqui têm que comprar vinis “zero quilômetro” diretamente do exterior para revender aqui. Além desses, a feira do Mercado Público, por exemplo, comercia discos retirados dos armários dos colecionadores ou comprados de terceiros por um preço mais barato. De qualquer forma, os vinis não são vendidos a preços exorbitantes, giram em torno de 20 ou 30 reais. O valor, é claro, varia dependendo da dificuldade em se conseguir o disco e do estado de conservação do produto. “Entre os colecionadores se sabe o que é raridade”, afirma José Antônio. Há álbuns que são consenso, tanto ele quanto Jorge da Rosa, outro vendedor do Mercado, são uníssonos ao classificar como raros: o primeiro e renegado disco de Roberto Carlos, Louco por você – assim como todos grandes sucessos da Jovem Guarda –, Paêbiru, de Zé Ramalho (que teve grande parte da tiragem destruída em uma enchente no galpão da gravadora), ou Tim Maia Racional Vol. 1, recolhido pelo síndico do Brasil quando ele saiu do Universo em Desencanto. Raridades como essas podem chegar a 1000 reais, ou, no caso do álbum do Rei, até a incríveis 5000 reais.

No processo de aquisição para revenda, Jorge ressalta a importância da internet e de sites como Mercado Livre. Dono de um acervo de mais de mil discos, o proprietário da banca Arco da Velha prefere não se desfazer de sua coleção. Costuma vender o que compra ou repassar discos repetidos ou pouco escutados. Jorge é considerado por outros feirantes um especialista em black music e soul. Apesar de contar com preciosidades desses gêneros, é preciso sempre ter aquilo que todos buscam. “Sem Beatles o vendedor não vive”, brinca. Pink Floyd, Led Zeppelin, Black Sabbath, AC/DC também estão entre os mais procurados. O público é diversificado, e surpreende o número de jovens interessados. Como João Augusto, proprietário da Polysom, conta, há três parcelas de público que podem fazer o mercado do vinil crescer: uma ativa que briga com ardor pelo vinil, outra que ainda não se manifesta pela falta de oferta e uma terceira que reúne o público jovem que ainda vai conhecer o formato e se apaixonar pela experiência sinestésica que só o vinil pode proporcionar.

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